EXTINÇÃO DA ALÍQUOTA EFETIVA DO PIS/COFINS APLICADA SOBRE A TARIFA DE FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA, EM DETRIMENTO DA ALÍQUOTA NOMINAL PREVISTA EM LEI
Por: Antonio Ganim
Advogado e Contador
Sócio da Ganim Advogados Associados
1. A cobrança do PIS e da Cofins, pelas concessionárias de serviço público de distribuição de energia elétrica, por meio da alíquota efetiva variável a cada mês, em vez da cobrança por meio da alíquota nominal de 1,65% (PIS) e 7,60% (Cofins), que tem gerado desconforto junto aos consumidores e fiscalização da Receita Federal do Brasil (RFB), é uma situação única, existente no Brasil, e tem suas explicações e justificativas, face ao modelo tarifário existente na época de sua instituição, pelo qual a custos gerenciáveis da Parcela “B” era definido com base na “empresa de referência”. Assim, primeiramente abordaremos com mais detalhes os motivos da adoção da alíquota efetiva, que com a evolução da metodologia de revisão tarifária, esses motivos, acreditamos, deixaram de existir, sendo necessário que a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), avalie essa norma vis-à-vis a atual metodologia, promovendo as alterações, de forma que o setor elétrico passe a adotar as alíquotas nominais estabelecida em lei, a exemplo de qualquer outro seguimento.
2. Originariamente, por disposição legal, o regime de tributação do PIS/Pasep e da Cofins era cumulativo e a alíquota dessas contribuições (PIS – 0,65% e Cofins – 3,00%) era incluída na tarifa de energia elétrica pela ANEEL, de forma simples e conforme determinava a legislação pertinente. Todavia, a partir do momento em que o regime de apuração dessas contribuições passou a ser pelo regime não cumulativo, a ANEEL excluiu o PIS/Pasep e a Cofins da tarifa de energia elétrica[1], passando essas contribuições a ser incluída pelas próprias concessionárias de distribuição de energia elétrica na Nota-Fiscal/Conta de Energia Elétrica pela sua alíquota efetiva[2], calculada a partir do valor efetivamente a ser recolhido (valor apurado pela alíquota nominal deduzido dos créditos[3]), dividido pelo total da receita, conforme estabelecido na Nota Técnica n° 115/2005-SFF/SRE/ANEEL, emitida pelas Superintendências de Fiscalização Econômica e Financeira – SFF e de Regulação Econômica – SRE da ANEEL, e repassado ao consumidor com uma defasagem de sessenta dias.
3. A seguir, ilustramos com slides da apresentação feita pela SFF/ANEEL ao Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, nos quais a metodologia constante da citada Nota Técnica foi apresentada, inclusive com valores hipotéticos para cálculo da alíquota efetiva:
4. Essa situação, única, que ocorre no Setor Elétrico, tem uma explicação fundamentada na lógica econômico-financeira e contábil e existe pelo simples fato de que não era possível a identificação dos componentes geradores de créditos de PIS/Cofins, pela ANEEL, quando da inclusão dos custos da Parcela “A”[4], e da Parcela “B”[5], para fixação da tarifa, principalmente em relação à Parcela “B”, cujo valor era apurado por meio da “Empresa de Referência”, constante do modelo da época. Já em relação aos créditos dos componentes da Parcela “A”, alguns deles, naquela época, ficaram dependendo de discussões junto a Receita Federal do Brasil, o que só veio a ser esclarecido com a Solução de Consulta n° 27/2008 – Cosit, em resposta à consulta feita pela ABRADEE.
5. Como não era possível a identificação dos créditos em cada componente de despesas da Parcela “A” e “B”, na formação tarifária, a ANEEL optou pela inclusão, desses componentes de custo, na tarifa, pelo seu valor bruto, sem a exclusão do PIS/Pasep e da Cofins. Assim sendo, se a ANEEL continuasse a incluir as alíquotas nominais na tarifa, estaria contribuindo pela cobrança em duplicidade dessas contribuições junto ao consumidor. Por esse motivo a ANEEL passou a excluir as alíquotas dessas contribuições quando da fixação da tarifa.
6. Com a aplicação da alíquota efetiva sobre a tarifa fixada pela ANEEL, pela própria concessionária de distribuição de energia elétrica, a mesma passou a receber essas contribuições de duas formas, a saber: (i) a primeira, por meio dos custos brutos incluídos na tarifa (sem a exclusão do PIS/Pasep e da Cofins se creditada pela concessionária), da Parcela “A” e “B”, e; (ii) a segunda, pela inclusão da alíquota efetiva pela própria concessionária.
7. Como se pode observar, pelo acima exposto, apesar do PIS/Pasep e da Cofins serem contribuições não cumulativas e recuperáveis, elas receberam um tratamento tarifário diferenciado daquele dado ao ICMS que é um imposto não cumulativo e recuperável, face à dificuldade da identificação, pela ANEEL, dos custos que dão direito ao crédito dessas contribuições, dada as exceções previstas na própria norma dos tributos em comento. Ou seja, enquanto o custo dessas contribuições é repassado ao consumidor com base na alíquota efetiva, para o ICMS o repasse do imposto é com base na alíquota nominal tomando como base de cálculo o valor da saída da mercadoria.
8. Repise-se, essa diferença de tratamento ocorre em função da possibilidade de identificação dos créditos do ICMS, quer seja pela exclusão do mesmo no item da Parcela “A” (compra de energia elétrica[6], quando for o caso), quer seja pela exclusão do seu montante no valor das compras de bens que comporão o Ativo Imobilizado em Serviço[7] (incluído na Parcela “B” da tarifa como item Depreciação), que ocorre no momento da formação do banco de preços, conforme disposto no parágrafo 39 do item 4.1.1 – DETERMINAÇÃO DO VALOR NOVO DE REPOSIÇÃO – VNR do Submódulo 2.3 do Módulo 2 do PRORET[8], ao dispor que os “IMPOSTOS RECUPERÁVEIS”, devem ser expurgados dos valores das compras praticadas pelos Agentes de Distribuição. Destaque-se que, o disposto no item 2.3 da norma, trata somente dos impostos e não das contribuições recuperáveis.
9. Importante frisar que a alíquota nominal do PIS/Pasep e da Cofins é de 1,65% e 7,6%, respectivamente, totalizando 9,25%. Quando a alíquota efetiva dessas contribuições, em determinado mês, somadas alcançam o percentual de 5%, é porque a diferença, em relação à alíquota nominal, correspondente a 4,25% (9,25% – 5,00%) está incluída no custo da tarifa (Parcela “A” e “B”) e correspondeu ao crédito tomado pela Distribuidora de Energia Elétrica.
10. Conforme já comentado, se fosse possível excluir das Parcelas “A” e “B” todos os possíveis créditos de PIS/Pasep e da Cofins, a ANEEL assim o teria feito desde o início, e então teria incluído a alíquota nominal de 9,25% na tarifa, pois os tributos não cumulativos devem ser repassados integralmente ao consumidor de energia elétrica, pela própria lógica do regime de tributação.
11. Ocorre que, a metodologia tarifária foi se aperfeiçoando ao longo dos anos, não se aplicando mais a metodologia da “Empresa de Referência”. Atualmente, com base nos custos realizados pela concessionária, constante do Balancete Mensal Padronizado (BMP)[9], a ANEEL trabalha na identificação do nível eficiente de custos, que é obtida pela comparação entre as concessionárias de distribuição por meio de um método de benchmarking, que leva em consideração os atributos de cada concessionária, conforme disposto nos Procedimentos de Regulação Tarifária, Módulo 2, Submódulo 2.2.
12. No entanto, os valores dos custos que compõem a Parcela “B”, extraídos do BMP, já estão pelos seus valores líquidos, já excluídos das contribuições para o PIS/Cofins, conforme previsto no próprio Manual de Contabilidade do Setor Elétrico, aprovado pela REN n° 605/2014, conforme exemplo abaixo.
13. Confirmado essa metodologia de apuração dos custos pelo seu valor líquido, extraídos do BMP, não resta dúvidas que as concessionárias de serviço público de distribuição de energia elétrica poderão estar deixando de receber o PIS/Pasep e a Cofins incidentes sobre a Parcela “B” da tarifa, pois o pressuposto básico da existência da alíquota efetiva é o de que os valores dos custos da Parcela “B”, a serem incluídos na tarifa, seria pelo seu valor bruto e não líquido.
14. Concluindo, é necessário que a ANEEL reveja essa metodologia da alíquota efetiva, eliminando a mesma, passando também a excluir o PIS/Pasep e a Cofins da Parcela “A”, quando da fiscalização da Conta de Variação da Parcela “A” – CVA, já que a Parcela “B”, apurada pelo BMP, já está pelo valor líquido. Dessa forma, de acordo com a data do reajuste ou revisão tarifária, poderá ser autorizado que cada concessionária passe a adotar a alíquota nominal de 1,65% para o PIS e 7,60% para a Cofins. Os possíveis saldos existentes na conta corrente da alíquota efetiva, que devem estar reconhecidos contabilmente como “Ativos financeiros setoriais – Outros”, poderão ser incluídos como item financeiro na tarifa.
Brasília – DF. 22 de janeiro de 2019.
Antonio Ganim
OAB/DF 14.605 CRC/DF 4.216
[1] A alteração de regime cumulativo para não cumulativo ocorreu em 2002 e 2003, para o PIS/Pasep e Cofins, respectivamente. A ANEEL só veio fazer a alteração em 2006, sendo que a diferença dessas contribuições, cobradas a menor do consumidor foi incluída como item financeiro no reajuste/revisão tarifária.
[2] Diretoria da ANEEL, na 9ª. Reunião Pública Ordinária, realizada em 14/03/2005 (Processo n˚ 48500.003826/2004-03), aprovou o modelo de aditivo ao contrato de concessão, que, entre outros aspectos, excluiu os percentuais relativos às contribuições ao PIS/Pasep e da Cofins do cálculo das tarifas dos Agentes de Distribuição de Energia Elétrica, e a aplicação da alíquota efetiva.
[3] Créditos admitidos com base no art. 3° das Leis n° 10.637/2002 e n° 10.833/2003.
[4] Custos não gerenciáveis (compra de energia, encargos setoriais, TUST, etc..).
[5] Custos gerenciáveis (O&M, depreciação e remuneração).
[6] Nos Estados do Amazonas e Ceará, não se aplica o diferimento nas operações com energia elétrica destinada à comercialização, incidindo, portanto, o ICMS nestas operações realizadas entre geradores, comercializadores de distribuidores.
[7] Atualmente a exclusão do ICMS ocorre no momento da elaboração da Base de Remuneração Regulatória (BRR), com base em laudos de avaliação. A depreciação é incluída na tarifa com base nessa BRR.
[8] Procedimentos de Regulação Tarifária, normativo da ANEEL.
[9] Exigido pelo Manual de Contabilidade do Setor Elétrico e enviado mensalmente para a ANEEL. REN n° 605/2014.